INQUISIÇÃO, TRIBUNAL DO SANTO OFÍCIO
Criada sob o pretexto de preservar a fé católica
diante do crescimento das heresias, a Inquisição foi uma das etapas mais
sombrias da humanidade e da igreja. Em nome de Jesus muitas pessoas foram
perseguidas, torturadas e mortas.
Conhecida popularmente como Tribunal do Santo
Ofício, a inquisição era uma função da Igreja Católica. Na medida em que a
igreja foi organizando sua estrutura, estabeleceu também suas regras que, com o
tempo, foram organizadas no Direito Canônico. Os conflitos internos da igreja deram
origem ao policiamento do clero, a investigação disciplinar, mais tarde usado
no combate ao que eles chamavam de heresias.
O crescimento do dogmatismo, da coerção e do poder
material da Igreja, provocou o surgimento de outras igrejas. Algumas tentavam
recuperar a pureza e a austeridade da Igreja Primitiva. As dezenas das chamadas
seitas que surgiram pregavam uma nova ética cristã, em oposição à opulência,
riqueza e aos desmandos da Igreja Católica, que tinha como meta apenas sua
prosperidade econômica. A vida luxuosa de alguns líderes da igreja Católica fez
com que a população menos favorecida não reconhecesse mais a função religiosa
dos representantes do clero.
Novas interpretações religiosas passaram a assumir
o papel de uma igreja que se distanciava de suas funções espirituais. Foi dessa
forma que surgiram diversos grupos como os joaquistas, os beguinos, os
flagelados, os humilhados, etc.
A doutrina chamada pela igreja de herética mais
conhecida foi a dos cátaros (puros) ou albigeneses, que se desenvolveu na
França, no norte da Itália e norte da Alemanha, durante o século 11. Os cátaros
tinham uma igreja organizada e pregavam uma vida simples em comunidade.
Defendiam a castidade, o jejum e o vegetarianismo. Organizavam-se em dois
grupos: os fiéis e os perfeitos. Diante da opulência da Igreja Católica, a
seita atraiu um grande número de adeptos.
A igreja fez oposição aos cátaros com a cruzada
Albigenese, que assolou a França durante a primeira metade do século 13. Foi
nesse período que as ordens mendicantes dos dominicanos e franciscanos tentaram
envolver os hereges com o exemplo de pobreza e humildade.
Muitos hereges eram linchados pela população, e
muitos governantes passaram a persegui-los. Dessa forma a Santa Sé (Roma), foi
pressionada a oficializar a perseguição aos hereges. Oficialmente as primeiras
iniciativas partiram do papa Lúcio III, que amparado pelas recomendações dos
concílios de Latrão (1179) e Verona (1184), unificou a repressão às chamadas
pela igreja de seitas heréticas.
As atividades inquisidoras do episcopado se
intensificaram com o apoio de diversos reinos contra as doutrinas não
autorizadas pela Igreja de Roma. O castigo adotado foi o da fogueira contra o
delito de lesa-majestade divina, considerado o mais grave crime que poderia ser
cometido por uma pessoa.
No entanto, os bispos da igreja não conseguiram
controlar a situação. Em 1216, o papa Inocêncio III, elegeu São Domingos de
Gusmão, fundador da ordem dos Dominicanos, presidente de um tribunal especial
em Toulouse, na França. As decisões do papa tinham como base as determinações
do Quarto Concílio de Latrão, de 1215, que estabelecera regras e sustento
doutrinário para a inquisição, que foi chamada de “inquisição delegada”,
presidida e executada por membros da igreja.
Dessa forma outros tribunais foram criados, ligados
a Santa Sé. A estrutura definitiva do Santo Ofício foi delineada no concílio de
1229, em Toulouse, e consolidada em 1231, por bula do papa Gregório IX.
A bula Licet ad Capiendos, do papa Gregório IX, datada
de 1233, marcou definitivamente o inicio da inquisição: “onde quer que os
ocorra pregar, estais facultados, se os pecadores persistiram em defender a
heresia apesar das advertências, a privá-los para sempre dos seus benefícios
espirituais e proceder contra eles e todos os outros sem apelação, solicitando
em caso de necessário a ajuda das autoridades seculares e vencendo sua
oposição, se isto for necessário, por meio de censuras eclesiásticas
inapeláveis.
Os chamados inquisidores delegados, geralmente
dominicanos ou franciscanos, passaram a agir com eficácia, embora ainda
existisse a ação inquisidora dos bispos. Os tribunais eram subordinados ao
papa, mas agiam com relativa autonomia. No entanto tornou-se evidente a
necessidade de se criar uma coordenação geral das atividades dos tribunais.
Dessa forma, o papa Urbano IV crio em 1263, o cargo de Inquisidor Geral, que
passou a controlar todos os tribunais da inquisição.
Apesar de ter sido um instrumento útil e poderoso
no combate aos chamados hereges, o Tribunal da Inquisição, por suas ações
cruéis e injustas, comprometeu a imagem de uma igreja que pregava caridade,
amor ao próximo e justiça.
A repercussão de suas atividades e o poder da
Inquisição foram muito grandes e se baseavam na idéia implantada a partir do
papado de Gregório VII, de que o papa era o representante de Deus na terra. Ele
estava no mundo como guarda supremo da fé, para velar pela humanidade, com o
poder de intervir nas relações sociais, políticas e religiosas. Qualquer
resistência poderia ser aniquilada por ele.
Durante o século 13 a igreja se considerava no auge
de seu domínio secular. O papa era o senhor dos corpos e das almas, e tinha
poder sobre o bem e o mal. Seus emissários, representantes e inquisidores não
executavam diretamente as torturas ou sentenças de morte, embora estivessem
presentes em todos esses atos. Após os interrogatórios os réus eram entregues
ao estado, às autoridades civis que sob a coação do poder da igreja, eram
obrigados a cumprir as penas determinadas aos réus. Caso contrário, também seriam
considerados hereges e submetidos ao tribunal.
A pressão era muito grande, pois o papa tinha poder
de interditar uma cidade inteira caso seu governante não seguisse suas ordens;
o que significaria que, no local os sacramentos da igreja não seriam mais
ministrados, e conseqüentemente todos os seus habitantes teriam suas almas
“ardendo” no purgatório.
Os acusados deixavam de ter direito aos sacramentos
e se reagissem de forma agressiva, às autoridades civis eram obrigadas a
intervir. Na primeira fase da Inquisição, o uso da tortura aos poucos foi sendo
extinto, sendo autorizada apenas quando já existissem provas do crime ou quando
o acusado já tivesse uma má fama.
Inicialmente a prática da tortura habitual nos
processos civis foi rejeitada pelos papas, que chegaram a punir alguns
inquisidores por sua crueldade. No entanto, em 1252, o papa Inocêncio IV
autorizou o uso da tortura quando houvesse algum tipo de dúvida sobre a
declaração do acusado.
De acordo com o Concílio de Viena, de 1311, os
inquisidores só poderiam usar a tortura com a autorização do bispo diocesano e
de uma comissão julgadora que analisava cada caso em particular.
A tortura poderia ser recomendada quando não havia
certeza sobre a culpa do acusado. Muitas vezes, a tortura era adiada para que o
medo do réu aumentasse e dessa forma ele decidisse confessar sua falta,
independente de ser culpado ou inocente, já que depois da acusação não havia a
possibilidade de alguém ser inocentado e jamais havia perdão. Aquele que
confessava deixava de ser torturado, mas não escapava da pena de morte.
Em 1376, surgiu uma espécie de regimento interno do
Santo Ofício, um Manual dos Inquisidores, elaborado pelo dominicano Nicolau
Eymerich. Mais tarde, o documento foi ampliado pelo dominicano espanhol
Francisco de La Peña. O manual era extenso e tinha detalhes sobre a realização
das acusações. Os hereges deveriam ser condenados a morte nas chamas em praça
pública. Havia o cuidado de se prender a língua dos réus ou amordaçá-los para
que não blasfemassem ou ferissem a fé dos que estavam assistindo o cumprimento
da pena.
Os inquisidores eram treinados para perceber
detalhes nas pessoas que justificassem suspeitas de heresia, tais como hábitos,
vestimentas e alimentação.
Judeus e sarracenos (muçulmanos) eram motivos de
ação dos inquisidores. Sofriam as mesmas suspeitas de heresia aqueles que não
freqüentassem a igreja ou não cumprisse seus sacramentos.
A grande ordem era exterminar todos aqueles que se
conduzissem contrário as ordens de Roma. As famílias dos acusados sofriam
terrivelmente, pois, além da zombaria geral, ficavam em total miséria, pois
todos os seu bens, móveis e imóveis eram confiscados pela igreja.
As execuções geralmente ocorriam em dias de festas
religiosas e eram precedidas pelos autos-de-fé. Celebrava-se uma missa e se
fazia a leitura das sentenças. As execuções eram públicas, eram ao mesmo tempo
uma prestação de contas da igreja e um alerta para as pessoas não cometerem os
mesmos crimes.
Não existia um limite de idade ou sexo para se ser
submetido à Inquisição e às suas torturas. As penas podiam ser brandas e
progrediam de acordo com a gravidade da acusação. Todos os castigos impostos
pela igreja envolviam flagelos, torturas e confisco de bens pela igreja. Quando
a sentença era prisão perpetua, o réu ficava a pão e água, logo morria de
inanição e seu corpo era queimado.
Os inquisidores prescreviam a tortura sem
intervenção de outras autoridades, e aplicavam-na com ajuda de outros irmãos da
Ordem Dominicana, em salas especialmente preparadas nos cárceres do Santo
Ofício.
Cada sessão não poderia passar de uma hora e não
poderia ser repetida. A confissão obtida sob tortura deveria ser ratificada
após um prazo mínimo de 24 horas, para se ter certeza de que o réu não se
acusara falsamente para acabar com o tormento. No entanto muitos acusados
morriam durante a sessão de tortura.
Na sociedade moderna a caça as bruxas e aos hereges
tornou-se importante, pois qualquer um poderia ser considerado ou apontado como
um inimigo. O estado por meio de leis proibia as atividades daqueles que eram
considerados criminosos pela fé. Dessa forma crimes contra a religião católica
eram julgados tanto pelo estado quanto pela igreja, pelo governador ou pelo
bispo.
O MAIS CRUEL DOS INQUISIDORES
Frei Tomás de Torquemada foi considerado o mais aterrorizante
inquisidor da história. Ele explorava a desconfiança popular com relação aos
judeus convertidos e divulgava a idéia de que o mundo deveria contar apenas com
“católicos puros”. Para estimular as delações Torquemada elaborou uma cartilha
com instruções que ensinava aos católicos como vigiar seus vizinhos e
reconhecer prováveis traços de práticas judaicas. O uso de roupas limpas e
coloridas aos sábados, a limpeza da casa na sexta-feira e a recitação de preces
diante de um muro eram algumas das características que podiam determinar uma
ligação com o judaísmo.
A INQUISIÇÃO EM PORTUGAL
Portugal vivia a grande aventura mercantilista dos
descobrimentos, que dependia do apoio econômico dos comerciantes judeus. A
rejeição portuguesa aos judeus partia da população estimulada pela Igreja
Católica. A coroa portuguesa sempre tentou contornar a situação dos judeus,
abrandando e esfriando os ânimos. Em alguns momentos protegiam-nos, proibindo o
constrangimento do batismo obrigatório.
Com a implantação da Inquisição na Espanha, a
situação portuguesa se alterou, pois o povo e a igreja julgavam uma afronta um
país que não tivesse a Inquisição em seus domínios. Por causa das perseguições,
muitos judeus fugiram da Espanha para Portugal, deixando a situação ainda mais
delicada e explosiva. Em 1487, D. João II obteve a autorização do papa para
punir os marranos (judeus convertidos ao catolicismo) que faltassem com seus
deveres católicos. Muitos morreram no fogo.
Apesar de se converterem ao catolicismo os judeus
fieis às suas crenças persistiam em não aceitar as ordens da igreja. Durante
estes anos vários massacres de judeus aconteceram em Lisboa. Muitos optaram por
fugir do país levando seus tesouros, o que prejudicou a economia nacional.
O SANTO OFÍCIO NO BRASIL
Embora o Santo Ofício não tenha estabelecido
oficialmente um Tribunal no Brasil, os bispos locais tinham poderes para
prender e confiscar os bens de suspeitos, enviar prisioneiros ou seus processos
a Inquisição em Lisboa. Eventualmente algum padre visitador, membro da
Inquisição vinha ao Brasil, e suas investigações concentravam-se em casos
envolvendo bruxaria, blasfêmia contra a igreja, além dos novos convertidos ao
catolicismo.
A primeira visitação do Santo Ofício que se tem
notícia no Brasil foi em 1591, estendeu-se por dois anos. Até 1624, foram
processados 245 novos católicos, todos sob a acusação de ainda praticarem o
judaísmo. Entre 1649 e 1748, cerca de 18 brasileiros foram condenados à morte
pela Inquisição em Lisboa.
O PEDIDO DE PERDÃO DA IGREJA CATÓLICA
No dia 15 de março de 2000, o papa João Paulo II,
no documento Memória e Reconciliação: a Igreja e as Culpas do Passado. Agrupou
as incorreções e os pecados cometidos pela Igreja no passado, quando levada
pelo seu crescente poder temporal, foi intolerante, opressora e até mesmo
corrupta. Com mais de 90 páginas, o documento tornou-se a maior demonstração de
expiação publica da história do catolicismo romano, pois por meio dele o papa
pediu perdão pela série de pecados cometidos desde a origem da Igreja. Entre os
diversos pecados citados no documento consta os da intolerância com os
dissidentes e guerras religiosas, compreendendo as Cruzadas e a Inquisição.
CONCLUSÃO
Pelos atos da Inquisição contra os judeus, chega-se
a compreensão do porque a Igreja Católica não reagiu ao Holocausto judaico na
Segunda Guerra Mundial.
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